Sempre que calha de aparecer a famosa entrevista de Caetano, em que ele repete diversas vezes que é foda e também lista vários outros artistas igualmente fodas, eu fico pensando como aquilo é uma verdade, não só por ele ser quem é, mas também pelo fato de que é importante reconhecer o próprio valor.
Acontece que sempre que vejo esse vídeo também fico me questionando no que eu me afirmaria como sendo foda.
Eu sou foda. Mas em quê?
Me considero tanta coisa. Boas e ruins também. Mais ruins do que boas, mas ando exercitando o amor próprio e o reconhecimento de minhas possíveis excelências.
Há uns meses discuti com uma pessoa via whatsapp (sim, sou essa pessoa que não consegue se limitar a um joinha passivo-agressivo; sou agressiva-agressiva - muito por conta da minha lua em Áries). O que começou com comentários aleatórios sobre a vida, escalonou para um bate boca horroroso que, por fim, culminou em um deixar de seguir o outro no Instagram, bem como uma foto de perfil desaparecida dos contatos do telefone.
Durante a discussão, a pessoa queria a todo tempo me fazer de doida (“você está confusa”, “você fala de forma confusa”, “eu não te entendo”), mas aí que está, eu me considero uma pessoa que na escrita se comunica razoavelmente bem.
Eu me garanto.
Nem sempre o que falo pode ter relevância para os outros, mas sentido acho que nunca me abandona. Sou minimamente coerente e coesa nas minhas construções de textos, tanto verbal quanto oralmente. E no verbal, incluo textos mais informais, como aquele da conversa que estava travando com a pessoa pelo app de mensagens, movida a puro ódio e indignação.
Pois uma coisa que me deixa “louca” é quem tenta me tirar como doida. Apesar de ficar extremamente chateada, ainda assim, creio eu, consigo manter uma certa linha de raciocínio e nexo no que estou comunicando.
Minha mãe foi quem me ensinou, quando ainda era bem nova, que a pior coisa que poderiam fazer contra mim, enquanto uma mulher, era me transformar em maluca. Assim, a ideia de tirar a sanidade de uma pessoa sempre me pareceu tão violenta quanto um tapa ou um grito.
Na análise, discuto com recorrência esse medo que me acompanha até hoje. Para além do debate feminista, eu tenho um enorme pavor de enlouquecer. Inclusive, evito consumir esses temas, pois me afetam sobremaneira. Não sei quando terei coragem, e essa é a palavra mesmo, para ler, por exemplo, Diário do Hospício, de Lima Barreto, ou Holocausto Brasileiro, da jornalista Daniela Arbex.
Mas voltando ao enfoque de gênero, a prática de gaslighting é uma das primeiras violências que atentam contra nós. E cabe a gente ficar sempre alertas, atentas e fortes para jamais embarcar nessa onda, sob pena de enlouquecer de fato.
Me doeu bastante ouvir as sugestões da pessoa de insanidade da minha parte, pois era alguém que eu nutria certa admiração. É recorrente a minha frustração em ver o quão violento pode ser um homem diante da não submissão feminina. Basta a gente se impor como uma igual e logo somos constrangidas dessa forma.
Eu não sou louca.
Apenas não concordei.
Eu não sou louca.
Somente me posicionei de forma contrária.
Eu não sou louca.
O outro, simplesmente, não alcançou o sentido das minhas palavras.
Eu não sou louca.
Eu sou foda.
.escrevo, assim, minhas palavras cheias de sentido.
Meus livros e discos e outras coisas a mais
Já que estamos falando sobre perturbação mental, vou deixar aqui como indicação o livro de contos da escritora Rita de Podestá, o seu Zaranza.
São histórias que tocam boa parte das mulheres jovens adultas, em seus dilemas e confusões vividos em relacionamentos amorosos, no caminho tortuoso que é o do amadurecimento e do se descobrir mulher.
Seguindo na mesma temática, iniciei a leitura da A Idiota, de Elif Batuman, e tenho gostado bastante. Meio zaranza, Selin enfrenta situações típicas do início da vida adulta, envolvendo amizade e amores. Tem sido uma leitura bem legal.
Acho que é isso.
Temos uma publicação?
Temos uma excelente publicação e muito obrigada por ela!!! bjks
Adorei o texto, penso isso o tempo todo. Direto acontece de algum homem repetir o que eu acabei de falar, ou querer me ensinar de cabo a rabo algo que eu sei e eu me pego pensando "eu tô doida ou ele tá sendo pura e simplesmente homem?". Talvez isso faça parte da experiência feminina.